E se o amor pudesse salvar a humanidade? Parte I

Desde o nascimento e durante toda a sua vida, o ser humano tem uma necessidade fundamental de amar e ser amado. No início da vida, a evidência demonstra que os chamados “cuidados afetivos” (no original, em inglês “nurturing care”) que incluem a interação entre os bebés e os seus pais ou cuidadores, um cuidado que responde às necessidades da criança e inclui também um cuidado a nível emocional; têm um impacto enorme no desenvolvimento da criança, incluindo no desenvolvimento cerebral e que pode atenuar os efeitos nefastos das experiências adversas na infância, tais como a pobreza (1). A necessidade de receber cuidados afetivos e de viver relações de amor continua ao longo do crescimento. Recentemente, países como a Escócia reconheceram nas suas políticas e programas a importância do amor para as crianças atingirem o seu potencial humano, como preconizado pela Convenção sobre os Direitos da Criança (2, 3). Finalmente, ao longo da sua vida adulta, o ser humano procura e vivencia o amor de várias formas, enquanto homem ou mulher, pai ou mãe, mas também pelo outro, a sua comunidade ou humanidade.

De facto, o amor pode ser vivido de diferentes maneiras e experienciado entre pais e filhos, no casal ou família, entre amigos, outras relações ou, como dizia, pela própria humanidade, sendo que cada uma destas formas de viver o amor é única. O amor é um dos sistemas cerebrais mais poderosos (4) e que nos leva a sentir um afeto ou carinho enorme, a criar um vínculo forte com alguém, a desejar, cuidar, proteger, confiar, ajudar ou partilhar com o outro. Através do amor, vivemos das emoções mais fortes que existem, tanto a nível positivo como negativo.

Ao longo da história da humanidade, o amor tem sido objeto de discussão, estudo e de inspiração em todas as formas de arte. O amor tem, sem qualquer dúvida, um papel preponderante nas nossas vidas. Mas, o que conhecemos realmente deste sentimento? Como é que cada pessoa o vive? Como é que sabemos o que procuramos no outro? Como é que desenvolvemos as nossas expetativas quando ao amor “romântico”? Como é que sabemos que o amor que damos aos nossos filhos é suficiente ou adequado? Há uma forma ideal de viver o amor? Como é que podemos expressar o amor? E, se o amor é um sentimento tão poderoso, será ele capaz de nos conduzir à transformação social?

O amor, como todas as nossas outras necessidades fundamentais, precisa de ser nutrido e vivido, sentir o amor em nós não chega. O amor é como um ser vivo. Não basta sentir o amor “romântico” por outra pessoa, é preciso expressá-lo através de palavras e gestos e é preciso vivê-lo através da partilha e experiência. Tal como o amor pelos filhos é transmitido através do cuidado, do carinho, da partilha e de outras experiências. O mesmo pode ser aplicado ao amor entre amigos ou mesmo o amor pela nossa comunidade ou humanidade. Sentir não chega, é preciso conhecer as emoções que nos faz viver o amor, compreender como é que o podemos viver a dois, a quatro ou até aos milhões. E é preciso fazer espaço e tempo, pois se este sentimento tem um papel tão grande nas nossas vidas e bem-estar, não será preciso conhecê-lo, vivê-lo, estimulá-lo e promovê-lo em todas as dimensões sociais e até políticas?

Ilustração por Dan23

(1) Black MM et al. (2016) Early childhood development coming of age: science through the life course. The Lancet. Advancing Early Childhood Development: from Science to Scale Series

(2) Véronique Lerch. O amor como um objetivo da política. Jornal Público. 10 de Fevereiro de 2023

(3) Government of Scotland. The Promise. The independente Care Review

(4) Helen Fisher (2007) Why we love, why we cheat. TED Talk

 

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