Para onde vão os sonhos?

Quando era criança – tirando um breve período aos seis anos em que quis ser hospedeira de bordo (aquelas senhoras bonitas que iam a sítios novos todos os dias!) – nunca tive uma profissão em mente. Nunca quis ser médica, professora nem estudar economia. Além disso, na minha família não haviam profissões propiamente ditas: de um lado e de outro, a minha família veio do campo e do mar e os meus pais foram fazendo os trabalhos que apareciam, recados, limpezas, serviço às mesas e afins. Lembro-me, quando comecei o quinto ano de ter que preencher um formulário escolar que perguntava a profissão dos meus pais e eu não sabia o que colocar. Não me lembro do que escrevi, talvez dono de restaurante, mas lembro-me de regressar a casa e a primeira coisa que perguntei foi “qual é a vossa profissão?” e a resposta foi “comerciante”, o que não me disse absolutamente nada.

A minha infância foi simples, porém eu tinha sonhos grandes. O que eu me imaginava a fazer era pensar, escrever, participar em tertúlias, viajar, conectar-me ao outro e (não esqueçamos!) salvar o mundo. Os meus sonhos eram grandes, mas eu não soube deixá-los guiar a minha vida, talvez fossem grandes demais para mim, ou pelo menos, para quem eu era na altura. Mas, agora que já sou crescida, tenho vontade de os revisitar, um a um, de conversar com eles pela noite fora, ver o que me dizem e para onde me querem levar hoje. Tenho vontade de fazer coisas loucas, como soltar todos os bichos do jardim zoológico, como sugeriria o Pedro Strecht ou então, usar o dinheiro do banco para me pagar tempo de escrita, reflexão, conversas e viagens.
Hoje quero ir à procura de mim, fazer espaço e tempo para os meus sonhos e, como dizia António Gedeão, deixar que o sonho comande a minha vida.

Ana

Pedra Filosofal por António Gedeão (extrato)

Eles não sabem que o sonho
é uma constante da vida
tão concreta e definida
como outra coisa qualquer,
como esta pedra cinzenta
em que me sento e descanso,
como este ribeiro manso
em serenos sobressaltos,
como estes pinheiros altos
que em verde e oiro se agitam,
como estas aves que gritam
em bebedeiras de azul.
(…)
Eles não sabem, nem sonham,
que o sonho comanda a vida.
Que sempre que um homem sonha
o mundo pula e avança
como bola colorida
entre as mãos de uma criança.

(traduzido do português)

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