Sobre a curiosidade inata das crianças para aprender

Todas as crianças nascem com a curiosidade e vontade para aprender: Nos primeiros anos de vida aprendem ao repetir uma e outra vez, com persistência. É assim, sem desistir, determinados, que aprendem a caminhar ou a falar. Mais tarde exploram, querem tocar, saber, perceber, experimentar texturas, alturas, sabores e tudo o mais que a vida se lhes apresente. A capacidade de aprender é inata a todo o ser humano ao longo de toda a sua vida, porém a curiosidade natural vai-se perdendo com o tempo pela forma como a escola e a sociedade estão organizadas. É preciso reconhecer a importância da curiosidade e vontade para a aprendizagem na vida de todo o ser humano e da nossa sociedade. O artigo 29.1(d) da Convenção sobre os Direitos da Criança pede que a educação da criança seja destinada a “Preparar a criança para assumir as responsabilidades da vida numa sociedade livre, num espírito de compreensão, paz, tolerância, igualdade entre os sexos e de amizade entre todos os povos, grupos étnicos, nacionais e religiosos e com pessoas de origem indígena.” Para assumir esta responsabilidade é preciso ir mais longe e, realmente fomentar na criança a vontade de aprender ao longo de toda a sua vida, de a ajudar a desenvolver aptitudes para se conhecer e melhorar ao longo da vida; e competências para aceitar a diferença no outro, ultrapassar o preconceito e questionar um sistema de valores que permite a persistência da guerra, da pobreza ou da fome. 

As pedagogias e abordagens de educação que favoreçam o contato com a natureza ou um ritmo mais próximo das necessidades fundamentais das crianças, tais como as promovidas nos países da Escandinávia, nas escolas Steiner/Waldorf, as escolas da floresta ou Montessori, fomentam na criança e, mais tarde, no adulto, essa semente da exploração e a curiosidade de aprender. Também as abordagens baseadas na inteligência emocional, empatia e compaixão permitem inculcar na criança o auto-questionamento e auto-desenvolvimento. Criar um sistema de educação que garanta que a curiosidade natural das crianças persista no tempo é possível e necessário.

O meu filho (de quase doze anos) na semana passada regressou a casa e, excitadíssimo disse-me:

- Mamã, mamã, hoje tivemos a aprender como é que sabemos se uma conta é infinita. Bem, eu já sabia, mas quero mesmo muito mostrar-te. 

Eu respondi que “sim, claro” e, então, ele partiu a correr para o seu quarto, foi buscar o quadro e mostrou-me um exemplo. Eu observei-o e ouvi-o com atenção enquanto fazia as suas contas em voz alta e tive orgulho, não apenas dele, mas também da educação que tenho conseguido proporcionar-lhe. O meu filho é parte integral da sua geração, de uma geração que nasceu numa Europa, rodeado de conforto e tecnologia para quem a internet está disponível 24 horas por dia e a cada fase de desenvolvimento correspondeu (quase) uma fase de ecrãs. Mas, ele teve também a sorte de viver a natureza e usufruir de pedagogias e educadores e professores que nutrissem a sua curiosidade natural. O meu filho não é muito trabalhador, mas adora fazer testes e todos os dias conta-me as novidades da escola como se fossem as coisas mais emocionantes da vida. Faz uma semana e continua a fazer as suas contas de matemática no quadro e, no final, a partilhar comigo os resultados, como se revelasse verdadeiros segredos. Se ele pudesse desenhar a sua escola ideal, essa não corresponderia certamente ao ensino que ele tem hoje (ou pelo menos não no seu todo), mas ele guarda ainda esse entusiasmo que ao longo da humanidade levou o ser humano a ultrapassar-se, a aventurar-se por mares desconhecidos, a descobrir curas para doenças, a criar obras literárias, plásticas e musicais que perduram no tempo. Para mim, o estímulo da curiosidade deveria ser um objetivo curricular e o artigo 29 da Convenção sobre os Direitos da Criança exige-o.

Para inspiração convido-vos a visitar o Greater Good Science Center da Universidade de Berkeley, nos Estados Unidos da América que publica artigos interessantes, incluindo sobre como fomentar a honestidade ou empatia nas crianças, a importância da natureza na vida das crianças e outros. Aconselho ainda o documentário “O começo da vida”, cujo trailer em português e inglês podem ver abaixo.

 

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